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Mostrando postagens de maio, 2017

Reflexo

Um dia desse eu cheguei em casa, Tirei a roupa, E parei, nua, diante do espelho. Mãos na cintura, postura reta, quase que congelada. Eu respirei fundo, e perguntei: - Quem. É. Você ? Assim, bem silabado. - Quem é você? Eu virei de lado, eu virei de costas, eu virei de frente pr'aquele reflexo crítico, pense num olhar duro, aquele ali, e perguntei: - Quem somos nós? Não adianta fugir, não adianta direcionar o olhar pras curvas, pras celulites, não. Responda. Além disso tudo, além dessa camada física, dessa roupagem, além do corpo, além de tudo que você vê, de tudo que você está me mostrando, que você está me apontando, quem é você? Quem somos nós duas, eu e você? O que queremos ser, no que queremos nos transformar? O que precisa passar por uma alquimia em nós? O que? Você acha, que o que precisa ser depurado, é o seu físico, os dez quilos que gostaria de perder? O que você acha? Um silicone? Uma redução da bochechinha? O que você acha? Você acha que você

Ensadecida

Faz assim, faz com força, com vontade, faz gostoso. Amarra-me, sufoca-me, toca-me, beija-me, chupa-me. Quero, derreter, gemer, gozar, desaparecer. Vou, subir e descer, gritar pra você, fazer o que você queira, te mostrar que sou sua, inteira. Então, amarra-me, e observa, observa eu rebolar ensandecida, louca, querendo você, em mim. Eu que controlo tudo, eu que quero definir o correr do relógio, eu, eu te dou o poder, eu me dou pra você, de bandeja, e todinha. Amarra-me e me domina. Hoje e quiçá amanhã, sou tua, sem pormenores, sem condições, tua. - Suelen Vieira Imagem: Apollonia Saintclair

Não é você, sou eu.

Não é você, Sério, Não é você. É minha vontade de amar, Minha vontade de voar, É minha vontade de pintar o infinito com alguém. Mas não é você. Provavelmente, não seja ninguém que já veio. Eu vou saber, Quando surgir, eu vou saber. Algo em mim vai mudar, E eu vou saber, Que a partir dali, Me tornei amar, Me tornei amor, E eu vou saber, Assim como sei agora, Que não é você. - Suelen Vieira

Quarto vermelho

Algum quarto vermelho, de um motel barato. Assim começa essa história, assim termina essa história. Você me veio, com a caixinha de Pandora, e ali mesmo, libertamos nosso bem e nosso mal, nossos anjos e nossos demônios. Que por ora, dançavam todos juntos. O que eu puder fazer pra te levar à loucura hoje, farei. Faço. Dois desconhecidos, dois amigos íntimos, dois amantes apaixonados. Somos. Tudo. Nada. O que faz isso aqui ser tão denso e forte? As mentiras que conto? As mentiras que me conta? Os contos que nos tornamos? O que faz o desejo ser tão desproporcionalmente maior que o bom senso? O que faz eu te querer tanto? O que faz você voltar? Perguntas, ecos de perguntas, que povoam minha mente, enquanto você nos serve a bebida quente. Quarto quente. Nós dois, quentes. Nós dois. Você se vira pra mim e eu esqueço de tudo, você varre os pensamentos, as palavras, as frases, os textos, tudo. Com um olhar você me esvazia. - Bebe! Bebida bebida. - Tira a roupa! Roupas caídas. - Agora, dança

Minhas linhas

Essa folha tem trinta e uma linhas, Minhas amadas linhas. Esse álbum tem trinta e um minutos, Meus amados discos. Meu passado tem algumas dores, Minhas amadas marcas. Meu futuro tem "n" possibilidades, Motivos para minha ansiedade. Minha vida tem tantos amores. Quanto ama um coração? Meu corpo vibra tesão. Quantas cabem numa noite? Eu transo em bons primeiros encontros. O que isso faz de mim? Sua boca suja me julga em seus encontros. O que isso diz sobre ti? Eu suspiro para céus azuis, Romântica incurável. A maldade me apavora, Ingenuidade impraticável. Meu ciúmes me maltrata, Descrença intolerável. Capacidade de confiar roubada, Porém, culpas não são terceirizadas. Você fez a cama De tão amargas lembranças. Eu me cubro delas, Pois me sinto tão cansada. Descrença e fé na vida, Palavras desconexas. Paixão e hiatos, Palavras desencontradas. Eu e você Você e ela Eu e ele Eu e ela Ele e ela Eu fiz mais que trinta linhas, Agora nem tão lindas, Mas para se

Paleta Universal

Sou todas as cores, Nuances, E tons. Sou todos os ruídos, Notas, E sons. Um abraço, Um cheiro, Um vinho do bom. Uma música, Uma dança, Memória, E lembrança. Sou todas as saudades, Todos os lutos, Todas as lutas. Sou todos os erros, Todos os pecados, E cada arrependimento. Sou toda inconsequência, Sou toda repetição, Toda incoerência. Sou compreensão, E ignorância. Ciúmes, E paixão. Zelo, E proteção. Apego, Prisão. Um universo... Onde todos os dias, surgem cometas. Onde todos os dias, morrem cometas. Suelen Vieira

Juice

Beba-me, como seu fosse o melhor líquido do mundo. Devora-me, como se disso dependesse a sua vida. Ama-me, como se eu fosse o último dos amantes. Toca-me, como se eu fosse a mais bela canção. Leia-me, como se cada letra formasse o mais belo poema. Sente-me, como se eu fosse o vento a te abraçar. Olha-me, como se eu fosse um quadro de Picasso. Molha-me, como se eu fosse a planta mais amada do seu jardim. Abraça-me, como se eu fosse seu cobertor favorito. Viva-me, como se eu fosse a própria vida. Mata-me, como se eu fosse a própria dor. Por fim, beija-me, como se eu fosse eu, e você fosse você. - Suelen Vieira Imagem: Nudegrafia

Eis me aqui

Eis me aqui, nua diante de ti, entregue. Eis me aqui, inteira, tua, crua. Eis me aqui, meia luz atravessa-me. Eis me aqui, sorriso sorri, olhar chora, alma florir. Eis me aqui, pra ti, por ti. Eis me aqui. vem. Eis me aqui, vem. Eis me aqui. tem-me. Eis me aqui, tem-me. - Suelen Vieira Imagem: autoria na foto.

Ser de água

Mulher é bicho esquisito, amigo. É rio, cachoeira, ribanceira. Juro procê, Bicho mais misterioso, não vai haver. Te afoga que cê nem vê, E cê volta, pra mergulhar de novo Porque tu é teimoso, Fica tipo menino bobo, Querendo se mostrar, querendo a ter. Andei por essa terra toda, E feito ela não achei. Já viu trem que quanto mais ama, Mais se derrama? Só mulher, só elas. Mulher é coisa linda, Se derrete de tudo quanto é jeito. Se ama, chora. Se transa, goza. Se ama e transa, Pronto, Vira rio, riacho e mar. Dá à luz, Dá amor, Dá afeto, Dá cuidado. Elas cuidam até delas mesmas, Dá abraço, Dá ouvido, Dá colo, Dá a mão. Elas cuidam até delas mesmas, Dá carinho, Dá prazer, Dá de morrer De gemer. Essas malucas são ciclo constante De morrer e renascer, Murchar e florescer, De se renovar, De se ser. Faca quente na manteiga, Mulher. Água-bruta na moleira, Mulher. Delicadeza no contato, Mulher. Dois filhos, pai pro mato, Mulher. É, menino. Mulher é um trem doido/doído.

AUSÊNCIA

Estava refletindo sobre isso, a ausência. Quando li sobre Tempos Líquidos, a palavra ausência não saía da minha cabeça.  Ausência e presença. Ausência e presença.  E isso ficou martelando. Soltar-se de tudo aquilo que possa me tirar do agora, desligar-me das possibilidades de fuga, e me concentrar em estar presente, em estar no presente, em não me esconder no ontem ou no amanhã. Se escrever ou ler sobre isso, parece fácil, difícil é fazer. Não é fácil, justamente por tudo ser tão líquido. A era da tecnologia facilita tanto nisso não é? Temos nas mãos um mundo, que nos permite a um clique estarmos ali, estarmos lá, estarmos em qualquer lugar, menos onde de fato estamos. Tenho dificuldade em viver o momento presente, em estar presente. E acredito que muitos compartilham dessa dificuldade. A gente está constantemente buscando fugas, fugindo da nossa própria consciência. O processo de se interiorizar e refletir sobre nós mesmos, sobre nossas atitudes, sobre o porquê de padr

Meios

Em meio a tudo isso, no meio de toda essa confusão, de todo esse caos de emoção, no meio da poeira da casa, no meio da bagunça da mente, no meio do abandono, no meio do experimento, no meio da rua, no meio do caminho, no meio da gente, no meio deles, no meio de vocês, no meio do mundo, no meio dessa história, no meio daquela história, no meio do nosso sexo, no meio do nosso ódio, no meio da paixão, no meio da sala, no meio dos sentimentos, no meio da mentira, no meio da falsidade, no meio de tudo isso, de tudo aquilo, de toda essa mágoa, de todo esse silêncio, que precede o fim. No meio do fim, o fim chegou, no meio de mim, eu descobri mais, sobre quem sou, no meio de ti, eu descobri mais, sobre quem és, e quem sou com relação a quem és. Suelen Vieira

AGORAS

Rolava algum som, que não me lembro mais, estávamos em sintonia. O beijo encaixava, o corpo encaixava, a mente divagava, a alma sorria. Uma garrafa de vinho, tomada. A segunda, já pela metade.  Tudo um pouco mais lento que o normal, menos a mente, que te despia só com o olhar. Você tocava a minha cintura e eu te sentia em cada um dos meus poros, e não conseguia explicar pra mim mesma, como isso era possível. Sua presença era quente, e fazia meu coração bater bagunçado, como se de repente tudo saísse do ritmo, do compasso. Você beija o meu queixo, o canto dos lábios, e eu sentia o corpo todo inflamando. Eu fechava os olhos, me concentrando em não implorar pra ser comida, ali e agora. Afinal, eu não queria ser apressada. Você descia, sentia meu perfume, dizia gostar. Falava isso com essa voz rouca, colada ao meu ouvido. Passava as mãos em meus braços, quase sem me tocar. E me provocava arrepios, difíceis de explicar. A cada beijo, a cada gole, mais tonta, mais zonza. Tonta

Sou

Eu comemoro dois dias seguidos de alegria, eu agradeço abraços sinceros, aprecio silêncios que não incomodam, e suspiro quando olho pro céu, sorrio com mensagens, sou do tipo que acredita no melhor das pessoas, que se entrega pra emoção, sou do tipo viva, extremamente, dolorosamente, completamente, viva. - Suelen Vieira Imagem: Joseph Lorusso

Limite

Eu cheguei no limite de tudo, cheguei ao ponto de não querer me mexer, cheguei ao ponto de estar cansada demais pra me levantar, cheguei ao ponto de estar cansada demais pra sorrir. Quem me visse, saberia que algo foi embora de mim. Quem me visse, saberia que eu te perdi, ou que nunca tive a ti. Eu cheguei no limite de mim, e de lá comecei uma procissão, uma romaria, até chegar do outro lado de mim. Ainda estou no meio disso, mas já consigo que meu ponto de vista seja maior que um funil. Foi loucura o que fiz, foi loucura o que fizemos. De dois, viramos três, e depois viramos quatro. Foi loucura me preencher de ar, foi loucura esperar. Foi loucura te amar. Foi loucura pensar te amar. Nossa loucura era bem depravada, até nossa tristeza foi depravada. Foi loucura esperar algo disso. Fui louca, e por isso fiquei louca. Eu cheguei ao extremo da minha sanidade, ao extremo da minha intranquilidade, ao extremo de toda minha intensidade. Eu não tinha essa intenção, não ti

Primeiros Encontros

Sim, eu me apaixono no primeiro encontro. Se não for assim, eu nem volto. Sim, eu me apaixono no primeiro encontro, Ou quando te encontro pela primeira vez, De uma forma que ainda não havia encontrado. Eu me apaixonei por você, Sentados no chão, Conversando por horas, Sobre sua vó, Sobre sua relação com seu pai. Eu me encantei pelo olhar, ao falar de coisas importantes pra você. Eu quis me tornar um motivo assim, Pra um brilho no olhar. Por você eu me apaixonei, Intermináveis vezes, Em incontáveis canções, Eu me apaixonei quando eu te vi amar ela, Cuidar dela, se preocupar, zelar. Me apaixonei na frase: - Elas são as mulheres da minha vida. Me apaixonei quando senti o seu cuidado. Me apaixonei da cama do hospital, e do outro lado da linha, te ouvindo cantar, só pra me acalmar. Por ti eu me apaixonei quando sua mão tocou a minha, Eu buscava paixão, E busquei nesse tato. Eu me apaixonei pela sua capacidade de amar, Eu me apaixonei pela sua capacidade de transformar, Eu me apa

Chuva

Chovia, e por isso me convidou a entrar. - Vamos esperar a chuva passar um pouco? Eu disse sim, e entramos. Eu me sentia em um sonho. Lembro do cheiro de tudo, até mesmo das paredes, do café que estava sendo feito, da chuva e das flores roxas que rodeavam sua casa. Do alto da varanda eu via um rio de águas escuras e verdes, que lembravam seus olhos, preferi guardar essa impressão pra mim. Você disse que iria pegar algo para nos aquecermos, e quando disse isso, eu me aqueci. O cheiro chegou antes de você, café. biscoitos. Comemos, entre olhares de baixo pra cima. Bebemos, entre olhares de lado. Sorríamos, quase que inebriados, com a possibilidade da tarde. Eu levantei, calada, fui até a varanda, você me seguiu calado, e ficou a me observar observando a chuva. Goteiras grossas se formavam, eu sentia a madeira, era um quadro bonito esse de agora. Você sabia o quanto eu era sensível a essas impressões. Você gostava disso. Eu sorri, você sorriu de volta. Me abraçou pelas

Qualquer

Nos encontramos numa noite qualquer, num bar qualquer. Você pediu uma bebida qualquer, com um sorriso de quem quer. Falamos sobre assuntos aleatórios, filmes aleatórios, músicas aleatórios, e na nossa aleatoriedade, combinávamos. Agarrou minha mão, como quem não quer nada, e me deu um cheiro, como quem quer beijo. Nosso primeiro beijo foi assim, de qualquer jeito. Não gravei dia, mês, hora ou local. Não, não. Juro que não. Fomos pra sua casa, brincar de qualquer coisa. A gente fez qualquer posição, a qualquer hora, e de qualquer jeito. Tonteria qualquer. Zonzeria qualquer. Eu era qualquer uma ali, você era qualquer um pra mim. Você dormiu, abraçado, atracado, a uma qualquer. Eu dormi, fundida, possuída, por um qualquer. Nesse jogo qualquer, viramos um querer. De um qualquer, tornou-se aquele. De uma qualquer, tornei-me dele. - Suelen Vieira Imagem: Leonid Afremov

SER

sou poesia, bagunça, sou caos, desordem, sou falta de tabulação, sou falta de parágrafo sou falta de vírgula. sou loucu r a sou q u e d a sou paixão, sou chama, inflama, ferida aberta, sou desejo e pecado, sou proibição, sou um texto errado, que nem você, nem ninguém ousa ler, sou manicômio, sou. sou beijo apaixonado, sou sexo desvairado, sou macumba bem feita, sou uma missa terminada, sou todas as religiões. sou mar, céu, sol, sou natureza. sou mãe, filha, pai, sou paz, sou a terceira guerra, sounião, sou segre gação, sou segredo, sou revelação, sou mistério, livro aberto, sou princípio, meio, e fim. sou o fim. sou o fim. sou o fim. sou. - Suelen Vieira

Demônios

Deitei-me com os meus demônios, Eram três, Entrelaçamos-nos, Éramos quatro, Enquadrados, Em quadrados, Em círculos também. Deitei-me com os meus demônios, Devoramos-nos mutuamente, A amante, O medo, E a dor. Deitei-me com os meus demônios, Ungiram-me, Rugiram pra mim, Urraram, E eu fui. Deitei-me com os meus demônios, E tirei a força deles, Um a um, Os fiz a meu bel-prazer. Deitei e rolei, com os meus demônios. Montei sobre meu carrasco. Beijei a amante, Gozei o medo, Gemi para a dor. Dormi com os meus demônios, Acordei, Ao meu lado estavam Três lembranças, Por ora, amaciadas. - Suelen Vieira Imagem: Apollonia Saintclair

Pêndulo

Me disseram algumas coisas, E eu vou dizer pra vocês também. Me contaram que sou sombra E luz também. Me falaram que sou o bem no mal, E o mal no bem. Disseram-me que sou a ausência de cores, E o arco-íris. A guerra, E a paz. O amor, E o desamor. O apego, E a indiferença. Falaram pra mim: - Você é o todo, o tudo, o nada e o abandono. Me disseram que sou todos os poemas, Todas as músicas, Todas as sinfonias, Todos os ruídos, E o silêncio absoluto, E o sete palmos abaixo do chão, E o luto, E o mero gemido, Da garganta emprazerada. Me disseram que eu seria sempre incompleta, Enquanto não aceitasse a polaridade de me ser, Enquanto não aceitasse, A frente e o verso. A luz e a escuridão. O feminino e o masculino. O positivo e o negativo. Aceitei. Aceitei guerras, pazes, lutas, lutos, Sorrisos, choros, amores, raivas. Aceitei. Busquei equilíbrio, Sou pêndulo, Balança, Libra. Sou caça, Caçador. Fera, Ferida. Palavrão, E amém. - Suelen Vieira Foto: Alexander Khokhlov

Batom vermelho

Deixar de viver, Para o batom manter? Pra que? Deixar de os lábios pintar Para então, poder viver. Por que? Viver assim, Tão sem cores, Tão sem borrões. Pinte e borde, Beije e borre, Vermelho e cabernet. Deixa tudo se misturar, Até azul virar. Disseram-me que, A cor mais quente, É o azul. Disseram-me que, Poesia se cria Com mistura. Fizeram-me crer, Que mistura se cria Com ternura. Cri. Ah, menina Qual o sentido da vida, Se largo de lado meu batom, Tão vermelho, Tão vivo, Pra te beijar? Ou não te beijo Tão suave, Tão macio, Pra o batom não tirar? - Suelen Vieira

Eu quero

Eu quero, Quero hoje, Quero amanhã, E quero ontem. Eu quero, Meu verbo é presente. Mas tão além deste presente, Tão além do passado, E também do futuro. De ontem, De agora. Esse verbo presente, Estica, estica, E vai lá no mês que vem. Vai lá na minha cama, Vai lá no café da manhã. O mesmo verbo presente, Estica, estica, E vai lá no mês passado. Volta de novo na minha cama, E me abraça, Encolhida, amuada. Por isto e por aquilo, Meu verbo presente é cauteloso, Cuidadoso. Cheio de dedo, De não me toque. Mas toque. Pois, definitivamente, Ele é presente. E definitivamente, Ele é atemporal. - Suelen Vieira

Não culpem a poetisa

Não culpem a poetisa por não viver o que ela escreve. Se ela fala sobre todo aquele amor próprio, e não o tem, talvez seja o que ela almeja. Se ela fala sobre toda aquela segurança, e ainda não a encontrou, pode ser o que ela busca. Se ela fala sobre se empoderar, mas não o é, talvez ela esteja apenas tentando. Não culpe a poetisa, por não viver o que ela escreve. Escrever é sobreviver. Escrever é criar novas realidades. Escrever é respirar. Escrever é se salvar de si mesmo. Não culpe a poetisa. Suelen Vieira

A dança entre o mar e a menina

Toda noite, ela dança pra ele. Toda noite, ela se despi de si, e se entrega pra ele. A lua brilha na pele nua, e ela dança pra ele. Ela trança o cabelo, e dança pra ele. Maré vem, ela inspira. Maré vai, ela expira. Maré vem, ela se joga pra direita. Maré vai, ela se joga pra esquerda. Maré vem, à frente. Maré vai, a trás. Ela dança e respira, no ritmo dele. Ela conhece seus mistérios. Ela conhece seus perigos. Ela conhece suas sombras. Ele conhece seus encantos. Ele conhece seus sorrisos. Ele conhece suas curvas. Ela lhe toca a areia. Ele se agita. Ela lhe caminha em direção. Ele se acalma. Ela lhe canta, com voz de sereia. Ele chora. Ele chove. Ele encolhe. Ela se vai. Ele se vai também. Ela se vem. Ele se vem também. A dança entre o mar e a menina. Eles se veem também. Ela lhe recita poesia. - Oh meu mar. Ele lhe repete a palavra. - Oh meu maaaaar... Ele a abraça. Ela sorri. Ele a envolve. Ela o sentir. Ele a engole. Ela se assusta. Ele a preenche de si. E

Tristeza

Ela chegou, impossível não notar. Ela chegou, murchando risos, mudando ritmos. Ela chegou, acelerou o coração, desacelerou os passos, que iam, agora, lentamente, pra debaixo da coberta, se deitar com ela. Ela chegou, e ela é linda, tem uma beleza fria, e também muito triste, quase mórbida, sempre irresistível. Ela chegou, me levou pra cama, se deitou comigo, e me jurou, que só ela me ama. Ela chegou, e a gente se aninhou, três dias seguidos, me sugou forças, fez eu esquecer das horas. Ela chegou, me consumiu, me devastou, me mastigou, e me cuspiu. Eu me enrolei inteira nela. Transamos. Trepamos. Fodemos. Amamos. Choramos. Adeus! Chegou a hora de mandar ela embora. Pedi com gentileza, que se retirasse da minha cama. Ela foi pro sofá, depois pro meu chuveiro, me acompanhou em uma ou duas saídas. Quando conheci alguém novo, ela estava ali. Pedi novamente, gentilmente: - Vai embora da minha vida! Ela já não se deitava comigo, nem chorava comigo no banho, já nã

Sete Vidas

Vivi todos os meus fins, pra talvez, chegar até aqui, e ter um começo só meu. Disse e ouvi, todos os adeuses, e cada um deles, me devastou em essência, e de alguma maneira, à sua maneira. Quantas vezes é possível morrer? Quantas vidas é possível se ter? De quantas maneiras podemos renascer? Quantas, eu posso ser? Quão bom somos? Quão mal somos? Quantas vezes é preciso se despedir, pra finalmente, dizer olá? O quanto preciso espernear perguntas pra então receber respostas? Rego flores mortas, esperando flores vivas. Vida. Pedaços de mim caem pra nascerem coisas novas. Nortes. Sinto o fim, os fins, todos, cada. Sinto em mim, assim, lodos, casca. Enterro sete amores, agora, pra adquirir sete vidas, por ora. - Suelen Vieira Imagem: Alex Stoddard

Blasfêmia

Chegamos e entramos Apagamos as luzes Acendemos o abajur O incenso e o cigarro Nos acendemos E agora, acesos Beijos e abraços Abraços e apertos Você me vira  De uma só vez Me beija o pescoço E as costas inteira Sua presença se faz Presente em mim Toda Inteira Calor Nas bochechas, no colo Na cintura, nas coxas E entre elas, e abaixo dela Sua presença me preenche Antes mesmo da tua posse Estou entregue, quente Ausente do resto Presente no agora Imploro. Por favor! Por favor! Eu quero! Agora! Por favor! Agora você me vira de frente De novo De uma vez Me olha nos olhos Me olha na alma De novo Você me invade Você tem disso Sua presença ocupa espaços vazios Me beija a boca Me morde os lábios Me beija no pescoço Me puxa os cabelos Me inclina, me faz gemer Antes mesmo de me ter Imploro outra vez Por favor meu bem Eu já não aguento mais Finalmente um som Além do som que toca no pc Você: - Ajoelha! Eu, obedeço, imediatamente E você me abençoa Com a benção mais sacana de

Amor

Primeiro amor Que não amei Segundo Que amei demais Terceiro Que inventei E quarto E quinto E sigo Pintando e bordando Amor Criando e inventando Amar Transformando e tornando Amer Enganando e mentindo pra mim Amir Chamo de outros nomes sim Sinto e os sinto Amur Até que chegue AMOR Aquele em maiúsculo Assim Que faça todo o resto Sumir Tornando vazia As palavras Tornando insignificante As sílabas Amor de olho fechado Que é Amor de cabeça pra baixo Que é Amor batido, jogado, escarrado Que é Amoramoramor Sem invenção, Juro que não. - Suelen Vieira